terça-feira, 22 de novembro de 2016

UM “BIG PUSH” RECOMENDA-SE MAS SEM PIROTECNIA...


Na actualidade, a teoria económica traz de volta, no âmbito da promoção do crescimento económico em tempos de crise, o grande debate sobre a necessidade ou não da intervenção directa do Estado na economia. Nesse sentido, são retomados conceitos como “big push” – também conhecido como “a teoria do forte empurrão ou forte impulso”, que foi desenvolvido por Paul Rosenstein-Rodan em 1943, um dos expoentes da teoria do desenvolvimento dos anos 50.
As discussões recentes sobre as condições necessárias para o crescimento económico urgente para Angola, colocam em cena abordagens como a incapacidade de se manter sustentável, a desaceleração elevada nas taxas de crescimento e a baixa produtividade com culpas claras sobre o modo como Estado angolano intervém, muitas vezes sem o devido controlo, na economia. 
actual crise reduziu as alternativas existentes e para piorar, ninguém pode, com o mínimo de segurança e optimismo, prever a duração das dificuldades que se esperam, devido aos elevados índices de incertezas, provocados pelo colapso financeiro e pela estagnação dos mercados internacionais nos últimos anos, dos quais fortemente depende o mercado angolano. 
Quando observamos em detalhe as diferentes formas de actuação do Estado Angolano no mercado interno, percebemos, com muita facilidade, uma intervenção “nociva” às boas práticas que conduzem à uma economia sustentada, pelos excessos na Regulação Pública da Economia (a exemplo da lei de investimento privado, completamente descontextualizada e que torna exageradamente Angola num país especial para o caminho do Investimento Directo Estrangeiro - IDE). 
Esse tipo de intervenção permitiu ainda, nos últimos tempos, um recuo evidente nas suas funções básicas tais como: a Regulação Pública, a Segurança Nacional, o Assistencialismo, a Justiça e a garantia da Saúde e da Educação. Por exemplo, as duas últimas funções, podem ser oferecidas pelo sector privado mas o Estado tem o dever de colocar à disposição da população (a isso chamamos Justiça Social). 
A Intervenção do Estado na economia é necessária para guiar, corrigir e complementar o sistema de mercado que, sozinho, não é capaz de desempenhar todas as funções económicas. “Primeiro, porque as operações do sistema de mercado impõem uma série de contratos que dependem da protecção e da estrutura legal implementada pelo Estado; Segundo, porque mesmo que os mercados funcionassem sob concorrência perfeita, a existência de bens públicos e externalidades, dariam origem a falhas de mercado que levam a necessidade de soluções através do sector público; e, Terceiro, porque o livre funcionamento do mercado não garante, necessariamente, o elevado nível de emprego, a estabilidade dos preços e a taxa de crescimento do PIB desejada pela sociedade”.
Partidário da ideia de que para tirar uma economia da estagnação e promover o seu desenvolvimento era necessário a realização de um conjunto de investimentos em uma gama variada de indústrias, promovendo-se verdadeiro ataque frontal, “visando provocar” um grande impulso na economia - “a big push”, para Rosenstein-Rodan, era, se vários sectores da economia adoptassem, simultaneamente, esse tipo de estratégia, cada um deles criaria renda que se tornaria uma fonte de procura por bens de outros sectores, ampliando assim os mercados e tornando a industrialização lucrativa para todos. Oportunamente, os novos ganhos se constituiriam em mercados para as novas actividades (Souza, 1999, p. 237).
Neste sentido, a intervenção do Estado pode dar-se através: da produção directa ou da concessão de subsídios, para gerar externalidades positivas; de multas ou impostos, para desestimular externalidades negativas; e, por outro lado, pela Regulamentação pública da economia. 
No caso específico de Angola, a visão de que o Estado é o indutor do desenvolvimento decorre, segundo a Constituição da República, das suas tarefas fundamentais: Criar progressivamente as condições necessárias para tornar efectivos os direitos económicos, sociais e culturais dos cidadãos e promover o bem-estar e a elevação da qualidade de vida do povo angolano; Efectuar investimentos estratégicos, massivos e permanentes no capital humano, com destaque para o desenvolvimento integral das crianças e dos jovens, bem como na educação, na saúde, na economia primária e secundária e noutros sectores estruturantes; e, Regular a economia e coordenar o desenvolvimento económico nacional harmonioso, nos termos da Constituição e da lei (Art. 21º da CRA 2010).
Portanto, sem muito folklore”  e “show off”, ao Estado Angolano recai a responsabilidade de coordenar, regular e fomentar o desenvolvimento nacional, com base num sistema de planeamento tendo por objectivo a promoção do desenvolvimento sustentado e harmonioso do País, assegurando a justa repartição do rendimento nacional, a preservação do ambiente e a qualidade de vida dos cidadãos. Isto significa muito além da promoção de simples workshops, feiras e outras actividades engalanadas  de vaidades e despesismos. 
Uma resposta aos desafios da Intervenção cuidada e sem “pirotecnia” - cujo intento é reduzir a vulnerabilidade externa, acelerar o crescimento económico e reduzir os níveis de pobreza - fundamenta-se no avanço dos processos de intervenção, em sua preservação e reforma. Nota-se, dessa maneira, insuficientes avanços para que a actuação do Estado angolano assegure certa sustentabilidade ao quadro macroeconómico. O ideal seria que o Estado actuasse onde o privado não se sente incentivado/motivado a investir. Aumentar o escopo de atuação do estado reduz a capacidade de ser eficiente e abre margem para ampliar gastos com despesas correntes e reduz a sua capacidade de promover o crescimento económico equilibrado. 
Nos dias de hoje, atribui-se maior protagonismo na arena internacional ao grupo de países BRIC’s, onde se evidencia um movimento de mudanças não apenas no grau de inserção desses países no comércio internacional, mas também numa readequação da capacidade dos Estados nacionais de redução do escopo de atuação (via privatização e desregulamentação) e se constatou a necessidade de se reforçar a capacidade de governar, de definir políticas, de estabelecer marcos regulatórios nítidos e consistentes, de modernizar as burocracias de Estado e de fazer cumprir a lei. 
Assim sendo, podemos afirmar que o Estado deve interferir na economia para que ela possa funcionar corretamente e a sua função se limita a isso. Se o Estado Angolano simplesmente abandonar a economia, certamente ela não irá prosperar e nem se desenvolver da forma esperada. O Estado também pode interferir no sentido de fazer com que a concorrência entre empresas se torne mais leal e sem ser abusiva para os consumidores, quando a economia não consegue se ajustar por si própria, quando é preciso tornar a concorrência mais justa ou fazer com que os consumidores adquiram mais poder de compra, etc. Todos esses ajustes trazem benefícios para a própria economia. 
Na prática, como podemos observar, os limites de actuação do Estado no mercado angolano precisam ser claros: tem de ajudar na cada vez mais liberalização do mercado, na garantia da eficiência no uso dos recursos disponíveis, na estabilidade política, económica e social e na equidade na distribuição e alocação dos recursos, assumindo uma cada vez melhor dinamização da economia, com um suporte legal que não prejudica a dinâmica económica, efectivando os planos existentes e fiscalizando a actividade económica, não permitindo o exercício de práticas anti-concorrenciais, salvo a existência de monopólios legais estrategicamente reconhecidos como sendo extremamente necessários.
A principal contribuição do modelo de Rodan é a consideração das externalidades na economia, rompendo com a visão da fórmula de investimentos graduais e políticas económicas clássicas, atribuindo a partir daí que para países em desenvolvimento não basta replicar modelos dos países desenvolvidos, é preciso levar em consideração realidades e contextos singulares, bem como, construir uma análise e estratégia apropriada ao cenário de cada um. Contudo, é possível identificar alguns elementos comuns às experiências bem sucedidas tais como a existência de uma política macroeconómica conservadora com forte controlo sobre a inflação, de um sistema educacional de qualidade e o mais universal possível; e de mercados organizados de forma aberta e relativamente eficiente”.
Seja como for, a economia de Angola está mergulhada num universo social cujos valores transcendem a noção de eficiência produtiva. Esta é, entretanto, fundamental para um viver mais confortável ou, dito de outra maneira, para o desfrute dos benefícios acarretados pelo desenvolvimento económico, onde cada cidadão possa usar com plena liberdade a sua capacidade de criação e de iniciativa para realizar suas potencialidades e outros valores que qualificam o desenvolvimento como amplo acesso aos serviços de saúde, educação formal e profissional de qualidade para todos e relativa igualdade de oportunidades.


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