A complexidade do
actual momento
económico, que cada vez mais agudiza os níveis de pobreza da população angolana,
fragiliza o sistema económico financeiro do pais, que acaba por se refletir na
produção, impondo a economia angolana, grandes desafios: dificuldades de importação devido a imposição dos
limites de saída de divisas; uma inflação alta, que atingiu níveis homólogos de quase 38% (dados do
INE), mais do que o dobro das previsões iniciais do governo; total
dependência do mercado externo, acompanhado de variações cambiais extremas e
como consequência, o
kwanza perdeu força e, como se não bastasse, as receitas fiscais
diminuíram e forçaram uma clara incapacidade do Estado em cumprir com
as suas funções. Todos estes males aguçam os graves problemas monetários e
fiscais que já não são passíveis de disfarçar.
Actualmente, observam-se
incumprimentos
das agendas pelas perdas financeiras da “irracionalização” dos recursos
públicos disponíveis e da crise cambial que nos afecta. A escassez de crédito,
com a redução dos investimentos, tem como consequência a desaceleração da
economia, resultando em menos produção, menos emprego, mais dificuldades na
obtenção do mínimo e num desequilíbrio da balança comercial e de serviços com o
resto do mundo.
Na perspectiva
económica, a crise pode ser vista como um período de escassez a nível da produção, da comercialização e
do consumo de produtos e serviços. Mas é
importante observar que os ciclos económicos reflectem sempre uma decadência de
um período de “vacas gordas”- expansão (boom). Período este, caracterizado por
um aumento da actividade económica e no qual as economias inteligentes criam
condições para take off, uma especie
de acumulação de capital sustentado, capaz de permitir uma decolagem com menos sacrifício
em tempo de penúria; ou a recuperação de
um período de estagnação ou de “vacas magras” – recessão (down) – onde os
índices voltam a subir e começa o boom
do ciclo seguinte.
O período de “recessão”,
na verdade, será o foco das nossas atenções. Um período
que ocorre quando, na ausência de novos investimentos, acompanhados do
arrefecimento do consumo, provoca uma queda na produção e consequentemente um decréscimo
na soma das riquezas produzidas de um país, por um período prolongado.
Quando olhamos
com “olhos de ver” para os nossos problemas económicos, políticos e sociais,
chegamos a conclusão que várias seriam as justificações superficiais e todas
elas nos remetem a uma letárgica “zona de conforto”.
Uns imputarão à
primeira zona de conforto, de
certeza, as Razões Históricas fortemente ligadas ao processo de Colonização versus Descolonização e as suas argutas
consequências que, com muita
agressividade, afectam o nosso dia-a-dia até hoje. Aqui são analisadas questões
como o modelo político adoptado (sistema de produção planificado/centralizado)
que produziu o chamado “estado assistencialista” e com isso a precariedade de
um modelo falido de produção, incluindo também, o índice populacional e a
indisponibilidade de recursos humanos capacitados/qualificados.
Estudos apontam, porém,
que a perda gradual
dos sectores produtivos agrícolas, a exemplo das grandes zonas produtivas de
café e algodão que constituíram durante muito tempo na maior força de
exportação para angola e, da perda da
capacidade produtiva das pequenas industrias herdadas da colonização, fruto das
nacionalizações e confiscos mal direccionada, geraram embaraços extremos nas
transições políticas e económicas.
Outros, de
certeza apegar-se-iam a segunda zona de
conforto que tem como principal Razão a Guerra Civil que devastou o nosso
país durante longos e infelizes 27 anos. No caso, são analisadas variáveis como:
destruição total das
infra-estruturas sociais e económicas; fragilidade governativa e um elevado
nível de instabilidade política e social; justo porque decidiu-se, a
determinado tempo, atribuir prioridade máxima “a garantia da paz, a assistência
social e a mobilização de doações”. Nesta época, o pequeno sector produtivo que
havia, ficou completamente paralisado, a excepção do sector petrolífero, ainda
assim, precário na época.
O Estado era o principal garante da
economia que, com o elevar da instabilidade política e económica, traduzida no
elevado desemprego, volatilidade dos preços e baixa produção nacional,
resultado do período longo de guerra, bem como, originou uma autêntica ausência
de coesão política partidária. O território nacional ficou dividido,
“completamente” minado e sem uma rede de transportes e comunicação funcional.
A terceira zona de conforto recai para Razões
Económicas, onde diferentes aspectos são analisados. A forte intervenção do Estado na economia,
numa concorrência desleal ao investimento privado, a forte dependência do
petróleo que é, acima de tudo, um bem volátil a exemplo do que se vive hoje,
registo de um crescimento económico atrelado, apenas, a um sector produtivo com
forte influencia externa; ausência de um sector privado forte, capaz de
influenciar o surgimento de uma estrutura de mercado competitiva; um mercado
financeiro não voltado para o financiamento do pequeno negócio – factor gerador
de elevado emprego.
Outro sim, a total dependência do mercado
externo, permitiu de certa forma, uma queda da produtividade resultante da
incapacidade do estado em pagar a dívida pública interna, uma redução na
capacidade de receitas resultante da baixa do preço do petróleo, e no descontrolo
total na elaboração, gestão e manutenção das políticas económicas, na
desvalorização intermitente e constante da moeda nacional e na presença de um
sistema financeiro completamente descontrolado, agravado pela ausência de uma
plataforma logística para distribuição da produção nacional e pelo efeito do
grande peso da economia informal – factor de grande desestabilização das
políticas publicas.
A quarta e última zona de conforto que
para nós, representa a de maior relevância, recai para a precariedade das
Infra-estruturas Institucionais. Ela, permite-nos perceber as fragilidades das instituições com
reflexos no total desrespeito a
propriedade privada, nos vícios instalados de
ociosidade na administração pública, extenuada pelo despesismo na gestão
do erário público (elevado índice de corrupção, nepotismo e precária
fiscalização)
e, na falta de sentido do
serviço público pró-cidadão, gerando um grande conflito entre o
funcionamento do mercado como tal e as dinâmicas políticas que fragilizam e
tornam ineficientes o sistema judicial, na maneira como assegura a observância
dos contratos e afecta a vida económica.
Instituições fracas, fragilizam o sistema
educativo, encarecem o custo de contratação da mão-de-obra nacional; e
promoveram o não aproveitamento real, efectivo e eficiente dos ganhos
económicos dos últimos anos de “vacas gordas”, derivado da alta nos preços do
petróleo. Elas também, fragilizaram o sector empresarial privado, que muitas
vezes se confunde com uma extensão do sector empresarial público.
Só assim se justificam, as debilidades
dos sistemas de controlo e avaliação na aplicação eficiente das políticas
públicas existentes o que de certa forma gera uma incapacidade de mobilização
do Investimento Directo Estrangeiro – IDE - para o fomento da produção
nacional. Acrescida da expropriação de terras de pequenos camponeses, agravando
ainda mais a condição de vida das famílias, com um aumento no nível geral de
desemprego, provocado pela ânsia da “acumulação primitiva de capital selvagem”,
grande causadora da Tragédia dos Comuns.
Verdade é que,
as consequências sociais da crise são sentidas para além
das fronteiras da sua própria origem e afectam os fundamentos da economia. Assim,
a definição mais justa para um conjunto de “linhas mestras para a saída da
crise económica em Angola” deverão, em princípio, tomar em consideração a ideia
de que existem diferentes obstáculos - “zonas de conforto” – a serem
conquistados. Pelo que, desafios como:
a) A Definição
de uma Estratégia de Desenvolvimento que compreende: A substituição
de importações por via do fomento da produção nacional, a eleição de
sectores produtivos direccionados para os mercados internacionais e a consequente
promoção de exportações. Para tal, créditos
preferenciais, subsídios as exportações, a reforma agrícola e o desenvolvimento rural que fomenta o convívio pacífico
entre o grande empresário agrícola e o produtor familiar são importantes para
garantir o fomento do emprego e o surgimento do negócio periférico;
b) A Garantia
do Financiamento para o Desenvolvimento que se traduz: na fiabilidade do funcionamento do
sistema financeiro (provisão, intermediação, disseminação, alocação e inovação
financeira), no fomento de bancos de desenvolvimento funcionais que retirariam
a exclusividade da gestão do angola-investe dos “primos” e tornariam mais
competitivas as diferentes linhas de financiamento e, na disponibilidade de
informações sobre a solvabilidade das instituições financeiras para estimular o
aumento do grau de bancarização e a consequente a aplicação das poupanças.
c) A Clareza no Papel do Estado na
definição de políticas e supervisão do sistema financeiro, o que implicaria
atribuir maior dinâmica a central de risco de crédito para garantir a perfeita
mobilidade de capitais. De certa forma, a definição clara dos limites do
intervencionismo do Estado na economia, influenciaria de forma positiva na maior
capacidade de mobilização do Investimento Directo Estrangeiro, para além da
disponibilidade do crédito ao investimento e dispor as famílias, pacotes de
microcréditos para o fomento do pequeno negócio.
d) A Garantia
das Infra-estruturas Institucionais “saudáveis”. Fundamentada por diferentes
autores, “as Instituições, a partir do seu conceito, podem conduzir ou ao
desenvolvimento, ou ao declínio de uma nação.” Impõe-se a garantia dos direitos de propriedade, a qualidade do Governo que envolve a percepção acerca da corrupção,
regulamentação e procedimentos, estabilidade macroeconómica, eficiência e integridade
dos sistemas judiciais, acrescida da pronta capacidade de uma Regulação que
flexibiliza e protege os investidores, impõem padrões de contabilidade e
permite uma melhor disponibilidade de informação e menos burocracias.
e) A Criação de um Ambiente Fiscal
eficiente que impõe uma reforma fiscal voltada para a garantia da
competitividade do mercado e a definição clara dos limites da actuação do
sector corporativo do estado. Serão vantagens a serem consideradas, se e
somente se, outras garantias económicas
que de certa forma impõe o alargamento do capital físico que corresponde a necessidade de uma plataforma funcional de suporte a
economia: rede de transportes conexa a plataforma logística, energia, água,
comunicação e tecnologia. Elementos essenciais na criação da riqueza, na medida
em que reforça a qualidade e produtividade decorrente do uso dos recursos
disponíveis.
f) A Contribuição
do Capital Humano na criação da riqueza nacional e o seu mais alto nível médio
de habilidade e conhecimento. Só assim, mais facilmente os indivíduos em idade
produtiva compreenderão e aplicarão as tecnologias disponíveis.
g) O Aumento no Controlo sobre Bancos e Instituições Financeiras e o
financiamento que dinamiza a construção de obras e de infra-estrutura para a
geração de empregos e aumento do mercado consumidor. A Concessão de subsídios e
créditos agrícolas a pequenos produtores familiares e a criação de previdência
social, que estipula um salário mínimo, além de garantias a idosos, desempregados
e inválidos.
h) Não menos importante, o agravar no controlo da corrupção na
Administração Pública e a consequente redução dos custos públicos e, sobretudo,
aumento da produtividade da função pública e o incentivo á criação de
sindicatos para aumentar o poder de negociação dos trabalhadores e facilitar a
defesa dos novos direitos instituídos na nova Lei Geral do Trabalho.
Para concluir, Angola continua a precisar de reformas estruturais
profundas, o que implica ter maturidade para que o seu desenho institucional seja
discutido e repensado. O Plano Nacional de Desenvolvimento que prevê uma “Angola progressista e solidária” tem que voltar a
estar no centro do discurso político.
Justo porque esta não será a primeira e nem a última crise, vai ser bom o
esmiuçar de aspectos falhados e a projecção de formas que asseguram a não
repetição dos mesmos erros. Não nos dotarmos agora, de estratégias de reacção
capazes que promovam a eficiência e a efectividade das Políticas Pública
engendradas, é pura e simples estupidez!
As lições não podem ser ignoradas, pois, “quem não reflecte no seu
passado está sujeito a repeti-lo” e fazê-lo, pode revelar-se grave e significar,
nada mais se não, o destruir, de forma irreversível, o projeto de Paz, de Desenvolvimento
e de Reconciliação Nacional entre os angolanos.
Sem comentários:
Enviar um comentário